assim, feito flor caída.

15:09 Ana Flávia Sousa 7 Comments




On My Mind by Donavon Frankenreiter on Grooveshark


 _ É caduca, olha só.  - Disse enquanto passeava com os dedos entre as ondas do cabelo dela.
_ Hein? Caduca? Eu? - Espantada, levantou subitamente do gramado daquela pracinha, e encostou a cabeça sobre os ombros dele.
_ É caduca oras, aquela árvore ali ó, não tem flores, nem folhas então é de caduca que a gente chama não é? Foi tu quem me disse, daquela sua aula de paisagismo não lembra?
_ Ah é, me lembro. Aquela acho que é um Ipê roxo, tá vendo? Mas suas flores eram cor-de-rosa antes de caírem nesse chão gelado daqui. Era roxo só de nome.
_ Um Ipê é? Mal dá pra ver. Fica irreconhecível sem flores, fica sosso, sei lá. 
_ É. 
_ É? 
_ É. Me sinto assim, não sabe? ca-du-can-do diariamente, aos pouquinhos. Gole por gole perdendo minhas flores pelo caminho...
_ Tá se achando irreconhecível também?
_ Um pouco. Isso é, sei lá... Acho que fui perdendo as flores - e - sonhos por aí, tenho medo de me esvaziar e no fim das contas, sobrar só casca, não entende? 
_ Entendo. 
_ Entende mesmo? 
_ Entendo. Mas sabe, no fim das contas mesmo, acho que tudo que a gente é, fica na raiz, tão bem guardado que não tem jeito de se perder...
_  Será? 

_  Eu acho. - Abraçou-a docemente enquanto pensava que só ela conseguia ser mais linda que aquele sol que estava pra se deitar nas montanhas, n'aquela cor que sobraria do desbotamento azul do céu, que vira dança em amarelo-ouro puro. 
_ Então...
_ Então, eu acho que você não se perdeu, só isso. Você abriu mão de alguns planos, desfez outros, mas nem por isso é alguém pior que já foi um dia. 
_ Sei.
_ Tô sendo sincero poxa, dá pra prestar atenção?
_ Continue. Tô ouvindo.
_ A gente perdeu muitas flores no caminho, é verdade. Mas vê só, elas caíram cá embaixo olha! Caiu, e virou adubo pra raiz ficar mais forte. Caíram as suas folhas, pra te encorajar a seguir em frente, s-e-m-p-r-e!   - E então ele se levanta e estende a mão pra ela levantar, e a abraça como se a estivesse protegendo do fim do mundo.
_ É por isso que não vivo sem você. - E beija suavemente o rosto dele. Depois a testa e o pescoço. Por último a mão e aquele símbolo dourado de união.
_ Por isso o quê? 
_ Por que você me faz seguir em frente e pensar que sou capaz.
_ Por isso eu te amo! 
_ Por isso?
_ É. Por você me deixar te proteger de você mesma. Você as vezes tem mania de lutar contra si mesma.

_ Me deixa dentro deste abraço pra sempre?


(um sonho bordado todinho em dentes-de-leão, 

passagem na travessa do ipê caduco, foi roxo, e cor-de-rosa, caiu todinho no chão, 

um final de semana todinho de abraço protetor, 

um tal de desbotamento azul, azul...

e 'oh my mind' que não me sai da cabeça

.

_ tudo, tudinho batido no liquidificador.)



7 comentários:

  1. Luisa Normandia Baeta Meloquarta-feira, agosto 29, 2012

    A leveza e sensibilidade entranhadas como o desbotar do céu, azul e amarelo-ouro puro.. Adoreiii!!

    ResponderExcluir
  2. Que delícia esse blog! Adorei a música, caiu como uma luva. E, meu deus, teu texto me fez lembrar de uma saudade que eu jurava que já tinha tirado de mim! Mas foi uma saudade boa, sabes? Foi sim, uma saudade boa. Lindo, lindo. Parabéns.

    ResponderExcluir
  3. Eu já disse tudinho, né?
    Fiquei, sei lá, de queixo caído, com os olhos marejados e uma vontadezinha imensa de chorar. Sério, tocou na ferida, lembrou do passado, lembrou do presente, sei lá. Fiquei perdidinha, Nana. E feliz, sabe?

    A parte do or você me deixar te proteger de você mesma. é tão real, tão cabível nesse meu momento...

    Tá lindo. É isso: 'tá mais do que lindo.

    Escreve em diálogos mais vezes.



    Beijo Nana.

    ResponderExcluir
  4. Os abraços deveriam ser mais caros do que qualquer lote do planeta.
    Neles moram as maiores certezas que gostaríamos de ter em uma vida inteira.

    A suavidade desse texto é como a cena final de um filme gostoso de ver.

    E é assim que deveríamos começar o dia. Todos os dias.

    ResponderExcluir
  5. Nossa, sem palavras Ana. A cada dia que passa as letras se tornam, simplesmente a sua alma, como não se comover com algo tão sublime.
    Parabéns, e que vc continue escrevendo coisas capazes de nos confortar e simplesmente nos deixar em questionamentos. E como a Maria Fernanda mesmo disse, gostei dos diálogos; escreve mais vezes.
    Bjão.

    ResponderExcluir
  6. Pratododia ♥ impossível não cantar Teatro Mágico!
    Além disso, você escreve tão bem. Ai, gostei muito :)

    ResponderExcluir
  7. A gente se perdendo e eles nos salvando, sempre. A gente caindo e eles sempre prontos para estender a mão e nos ajudar a levantar. Isso é que é companheirismo de verdade, isso é que é amor.
    Lindo, Aninha!
    Beijos e saudades!

    ResponderExcluir

:)